A prática excessiva de atividade física provoca fraturas, lesões de cartilagem e outras complicações. Saiba como evitar problemas
Luciani GomesDIVIDIDA
Renier faz judô. Mas quebrou o braço em uma jogada no treino de futebol
O carioca Renier Mamede Pina, 8 anos, faz judô há quatro e nunca
tinha quebrado um dedo sequer. Em novembro do ano passado, resolveu
expandir suas habilidades e foi para uma escolinha de futebol. Mas já
nos primeiros passes ele entrou em uma bola dividida, caiu de mau jeito e
quebrou o braço. Renier não é exceção, é regra: o risco de lesão é
inerente a crianças que praticam atividades esportivas.
A questão é que,
com o aumento do número de meninos e meninas que praticam esportes
regularmente – já que a maioria dos pais reconhece as vantagens da
atividade física –, o registro de lesões sérias em crianças também tem
crescido. “Há 15 anos, por exemplo, não tínhamos tantos menores com
lesões de ligamento”, afirma o médico Moisés Cohen, professor da
Universidade Federal de São Paulo. Trata-se de um fenômeno mundial.
Segundo um levantamento feito pelo Instituto Nacional de Saúde dos
Estados Unidos, dos cerca de 38 milhões de crianças e adolescentes
americanos de até 14 anos que praticam esportes, 3,5 milhões recebem
tratamento médico, por ano, para alguma lesão sofrida.
Os principais traumas são as contusões, fraturas e lesões da
cartilagem de crescimento (ela transforma-se em osso). Essas não
dependem de um histórico e não há como garantir que não vão acontecer. A
prevenção é no campo ou quadra mesmo, por meio de orientação técnica e
do uso de equipamentos adequados que estejam de acordo com a altura e o
peso dos esportistas.
“Além disso, aquecimento e alongamento devem ser
levados a sério e feitos no início e final da atividade”, diz Edson
Terra Cunha Junior, supervisor de esportes olímpicos do Flamengo e
coordenador das escolinhas oferecidas pelo clube no Rio de Janeiro.
“Quanto mais a musculatura estiver alongada, menor a possibilidade de
lesão.”
Mais difícil de diagnosticar e tratar, a lesão crônica ou por esforço
excessivo não surge de uma partida de futebol. É necessário um
histórico de sobrecarga para que ela comece a ser sentida. Assim, é mais
comum em quem já compete em alguma modalidade ou em crianças que
praticam esportes diversos. “A prevenção começa exatamente com um
planejamento das atividades físicas das crianças”, afirma André
Pedrinelli, presidente do Comitê de Traumatologia Esportiva da Sociedade
Brasileira de Ortopedia e Traumatologia.
EXCESSO
Francisco teve inflamação no joelho por causa do esforço no esqui.
Agora, reduziu a frequência com que o pratica
Outra recomendação aos pais é ficar atentos para que os esportes
escolhidos, quando mais de um, não exijam o mesmo esforço motor.
Basquete e vôlei juntos, por exemplo, não é uma boa ideia, pois em ambos
trabalha-se muito com os pulsos e os braços. Se o futebol substituir um
dos dois na combinação, alivia.
“Um programa de atividades
cross-training, que trabalha diversas partes do corpo, é uma boa maneira
de reduzir e prevenir as lesões por esforço excessivo”, diz Lindsay
Hansen, da organização Safe Kids USA, que advoga pela redução de lesões
na prática de atividades esportivas por crianças.
A intensidade do exercício é o outro grande vilão. O estudante
paulistano Francisco Fernando Corrêa de Almeida Nobre, 13 anos, pratica
esqui desde pequeno e hoje participa de competições internacionais. Há
três anos, no entanto, o sonho de um dia ser campeão começou a ser
assombrado por uma forte dor no joelho.
O diagnóstico foi de
osteocondrite (comprometimento da cartilagem e do osso abaixo dela). Há
seis meses ele deu início a sessões de fisioterapia para fortalecer a
musculatura da região, mas também teve de mudar a carga de treino,
recomendação número 1 de especialistas para casos de lesão crônica. “Não
cheguei a ficar sem treinar e competir, mas reduzi o esforço”, conta.
No último ciclo de preparação, por exemplo, Francisco se exercitou por
apenas 20 dias, metade do que costumava fazer. Aprendeu a respeitar a
dor e hoje quase não a sente mais.
A sobrecarga pode acontecer também devido a um longo período de
treino sem pausa. As interrupções são essenciais para garantir a boa
condição do corpo. “Não dá para jogar futebol em ritmo regular o ano
inteiro. É fundamental parar um pouco”, diz Pedrinelli. Por fim, na hora
de escolher o clube ou a escolinha, os pais devem levar em consideração
a infraestrutura oferecida. “É fundamental ter orientação de
professores de educação física, além do amparo de uma equipe médica no
local para que a criança tenha a melhor saúde possível”, diz o
especialista Cohen.